Eu sinceramente não me recordo da minha primeira aula de Ballet menstruada, pois já era adulta e muito acostumada com a menstruação, então, não foi um grande acontecimento que gerou insegurança. Muito provavelmente o máximo que senti foi um desconforto com o absorvente, que na época eu ainda usava. O absorvente, na minha opinião, é uma das piores coisas para se usar para fazer aulas de dança ou se apresentar. Ele se move, ele vaza, ele abafa… É um desconforto generalizado. Por isso, rapidamente migrei para o OB e, depois, para o coletor menstrual – pra mim, a descoberta do século! O coletor mudou meu período menstrual, me deu liberdade, segurança, conforto e a consciência tranquila de não estar despejando lixo e mais lixo no meio ambiente. Se posso dar alguma dica em relação a menstruação para bailarinas é: teste o coletor menstrual! Caso não funcione para você, ainda existem os discos e as calcinhas menstruáveis também.
O coletor mudou meu período menstrual, me deu liberdade, segurança, conforto e a consciência tranquila de não estar despejando lixo e mais lixo no meio ambiente.
Em relação à minha primeira menstruação, a menarca, felizmente não tenho uma história traumática para compartilhar. Eu tinha 10 anos e estava em casa. Fui ao banheiro fazer xixi e vi uma mancha diferente na calcinha. Foi estranha a sensação porque, ao mesmo tempo que eu não fazia ideia do que era aquilo, em algum nível (espiritual ou em função de uma memória biológica) eu sabia direitinho o que estava acontecendo. Não sei explicar. Mas não fiquei desesperada e nem com medo. Até porque, no meu prédio, entre as meninas, o papo sobre começar a menstruar já começava a circular timidamente. Lembro de flashes: minha mãe falando comigo do trabalho pelo telefone para explicar a respeito, feliz por eu ter “ficado mocinha” e meu pai indo comprar absorvente cedo na manhã seguinte antes de eu ir para a escola.
A menstruação foi normalizada e o impacto amenizado dentro da minha família, mas ainda assim, não me recordo de uma conversa profunda a respeito do meu ciclo com ninguém. Minha mãe não me explicou como funcionava o meu útero e como era o processo detalhado de gerar uma criança. Essas informações eu aprendi na escola, em revistas e na internet. E tudo com o filtro de uma sociedade patriarcal, é claro. Tanto que considero que estou realmente aprendendo sobre ciclos femininos e sobre o corpo da mulher cis hoje, depois dos 30 anos de idade. Para mim, isso é um problema. As mulheres precisam descobrir e conversar sobre os seus corpos desde a infância, em um ambiente seguro e acolhedor.
Professoras ainda usam o termo “naqueles dias”, professores homens sentem-se desconfortáveis com o assunto e fingem que nada está acontecendo, ou pior: agem com preconceito ou nojo. Quando na verdade, o que eles sentem não deve ser prioridade e sim o que as bailarinas que estão menstruando sentem!
Essas reflexões e experiências pessoais me motivaram a levar esse importante diálogo para dentro do mundo do ballet, onde a menstruação ainda é um tabu e, para muitas, motivo de vergonha. Professoras ainda usam o termo “naqueles dias”, professores homens sentem-se desconfortáveis com o assunto e fingem que nada está acontecendo, ou pior: agem com preconceito ou nojo. Quando na verdade, o que os professores sentem não deve ser prioridade e sim o que as bailarinas que estão menstruando sentem! Cólicas leves ou muito fortes, dores nos seios ou nas costas, humor instável, medo ou vergonha são muito comuns durante esse período. Todos esses fatores afetam diretamente o físico e o psicológico de bailarinas, que dependem de ambos para dançar. Logo, precisamos falar sobre menstruação como algo que acontece naturalmente no corpo das mulheres cis e não como uma doença. Quando passamos a nos conhecer e a entender como o nosso corpo vive a menstruação (pois isso é pessoal e varia de bailarina para bailarina), nós nos libertamos. Entendemos quando podemos fazer aula e quando é melhor repousar, entendemos que tipo de vestimenta funciona melhor e perdemos o medo de subir no palco menstruadas. Eu já me apresentei de branco umas duas vezes menstruada sem receio algum. Porque eu sabia que tinha tudo sob controle.
Desde o início do meia ponta o meu foco foi ser transparente e compartilhar experiências para que outras meninas e mulheres cis não se sintam sozinhas ou inseguras dentro do universo do ballet, e principalmente do ballet adulto. Logo, o assunto menstruação é urgente e fundamental. Afinal, dançaremos em períodos menstruais por quase toda a nossa vida!
Na série Bailarinas Menstruam, que eu e o perfil Ginecológicas criamos para o Instagram, há diversas dicas, palavras de apoio e informações importantes sobre dançar menstruada, desde como isso nos faz sentir até o que usar nas aulas durante o período menstrual. Você pode conferir os stories clicando aqui, ou acompanhar pela hashtag #BailarinasMenstruam.